segunda-feira, 5 de novembro de 2007

A Rosa que não tinha cor de Rosa

Era uma vez uma rosa. A Rosa não era cor de rosa, era vermelha. Toda a manhã a Rosa se perguntava:
- Com posso ser uma rosa se não tenho cor de rosa?
Intrigada com tamanho mistério, a Rosa foi perguntar ao velho Carvalho que era falante e tinha mania de ensinar todo mundo:
- Sr. Carvalho, sabe me dizer como uma Rosa pode não ter cor de rosa?
O velho Carvalho, o mais sábio e antigo morador do jardim, não sabia a resposta e a Rosa cada vez mais melancólica com suas dúvidas ficou triste.
No jardim das margaridas brancas e amarelas a Rosa que não tinha cor de rosa era a mais esplendorosa dentre as flores. Até o pessegueiro do qual os pássaros se serviam, indiferente a tudo e a todos admirava a beleza da Rosa.
Os pássaros que vinham de longe cantavam para a Rosa as belezas dos outros jardins. Cantavam a ela sobre todas as variedades de coisas que já tinham visto. Cantavam sobre as diferenças entre as pessoas. Tentavam mostrar com suas notas que não é importante se uma coisa é vermelha ou a outra amarela, se é azul ou cor de rosa. Falavam que o que importante é o que está dentro de cada um e por isso ela era a mais bela das plantas, porque a cor vermelha brotava de dentro do seu coração. Mesmo assim a Rosa não se consolava, ela queria ser como as outras rosas do jardim.
A Lua, nas noites de lua, jogava toda a sua brancura sobre o jardim só para ver se a Rosa ficava cor de rosa. Todas as outras flores empalideciam com o brilho da Lua. Ficavam cinza, sem graça. Menos a Rosa! Nessas noites azuis a Rosa ficava com um vermelho mais intenso, cor de sangue, e se destacava ainda mais dentro do jardim.
Numa tarde de outono o vento que vinha do oeste passou pelo jardim e ficou encantado com a beleza da Rosa que não tinha cor de rosa. Fascinado pelo escarlate da Rosa, o vento chegou pertinho da flor e soprou no seu ouvido:
- Quão bela és, oh Púrpura Flor, eu que já passei pelos quatro cantos do mundo, cruzei os sete mares, avistei tempos de guerra, e lugares de paz! Eu que já vi muitos homens, de todos os tipos. Eu que arrefeci beijos apaixonados e calafrios de morte. Eu que escalei montanhas e cruzei desertos. Já fui brisa e tempestade. Já levei comigo sonhos e flores! Rosa, por onde quer que eu tenha passado, por qualquer jardim que eu tenha visitado, jamais em toda a minha vida enxerguei beleza igual a tua. Venha comigo Rosa. Deixa levar-te comigo para dar ao mundo a tua beleza!
Apaixonada, a Rosa que não tinha cor de Rosa curvou-se ao pedido do vento. Para tristeza do jardim, pétala por pétala, semente por semente, a Rosa se deu ao mundo e subiu alegremente bailando com as brincadeiras do vento. As outras flores comentavam entre si a audácia da bela flor. O velho Carvalho, inconformado, esboçou um barulho nos galhos que lembravam um choro de tristeza e ficou mudo. Uma cotovia que se alimentava no pessegueiro tentou seguir a Rosa, mas não conseguiu. Cansada, desistiu quando a ultima pétala embalada no vento sumiu no horizonte.
O inverno daquele ano nunca foi tão rigoroso. O sol, triste por não ver mais a Rosa, mal esquentava o jardim. O frio deixou as flores cinza e o carvalho triste. Durante algum tempo o céu chorou!
Veio à primavera e rapidamente ela se foi. Nada tinha brilho no jardim. O verão foi brando e no outono as folhas caíram com mais tristeza. O inverno voltou frio e demorou a passar.
Na primeira manhã de uma nova primavera o sol iluminou com toda alegria o jardim. Os pássaros que migravam cantavam agora canticos novos e mais alegres. O pessegueiro se encheu de novos frutos e Felicidade. Alegres e cheias de vida, as margaridas coloriram outra vez o jardim. O velho Carvalho despertou e pôs-se a contar histórias e ensinar as novas margaridas sobre as coisas do jardim e depois daquela primavera ninguém nunca mais se lembrou da Rosa que não tinha cor de rosa.

(Licença poética para um final romântico – só leia se você for romântico)

Na terceira noite da primavera o velho e triste carvalho viu no campo um verde bem clarinho. Era um novo broto que surgia no jardim. Cheio de esperança chamou a cotovia para que ele pudesse ver perto e confirmar se aquele broto era Rosa. Quando chegou perto, o pássaro reconheceu aquele rubor e subiu aos céus para espalhar a boa nova. Do alto, a cotovia avistou outro ponto igual aquele e radiante percebeu que a Rosa não estava mais sozinha. Cantou alto o que estava vendo e a Lua curiosa saiu do seu esconderijo. De lá do céu, a Lua avistou uma porção incontável de novos brotos e, feliz da vida, iluminou o jardim como nunca havia feito antes. Na manhã seguinte o jardim tinha uma cor conhecida outra vez, mas não era única. O vermelho da Rosa que na não tinha cor de rosa se espalhava por toda a extensão do jardim e ia além. Por onde passasse, o vento poderia ver o brilho e a majestade púrpura que havia visto só uma vez antes, nas frágeis pétalas daquela pequena Rosa que não tinha cor de rosa.

mário coração dos outros

Um comentário:

Anônimo disse...

Adoro romantismo...
O segundo fim é bem mais interessante.
Mario com sua sempre veia artistica! Muito bom